
Uma coisa que vem a meter-me os cabelos de pé há algum tempo é ler isso:
"Advogado m/f" ou " A Juiz", ou "Exmo (a) Senhor (a)"... etc.
Porque razão a mulher vem SEMPRE em segundo lugar? Porquê que temos que AINDA arcar com a misoginia mas escondida, mas na mesma, misoginia? Porque temos ainda pensar quando ter os nossos filhos? Ou então por que razão as nossas sociedades formam autênticas castradas? Porque somos sempre a escolha por omissão? As mães deles também não pariram na mesma? Estarão eles neste mundo GRAÇAS a elas, ou não? Por que razão uma profissão que acaba por ter mais elementos femininos é menos prestigiada (o caso das professoras por exemplo, e agora das advogadas)?
Ontem um juiz virou-se para mim, no fim de uma leitura de sentença, e querendo talvez ter alguma graça, disse: "A dr.a tem aqui um pequeno erro no seu requerimento que até me deixou pensativo. Pois, começou-o com «ExmA (o) Senhora ou Senhor...". Hehehe, dava-lhe menos trabalho a forma tradicional..."
Retorqui com um sorriso amarelo que não tinha particular gosto pela tradição misógina deste país, portanto continuaria a escrever os meus requerimentos, petições e quanto mais, dessa forma. E não é que a delegada do Ministério Público pasmou-se, riu-se e disse-me que isso fazia todo o sentido.
Estou farta de fazer de conta que está tudo bem, que até estamos a ser bem tratadas, que afinal a nossa sociedade (tão) ocidental está a "fazer esforços" (afinal o que isso é?... somos umas doentes que temos que ter protecção?) para o tratamento igualitário. Qual protecção qual quê?! Os homenzinhos (e aqui friso que não falo dos homens) continuam a desprezar-nos e a manter-nos sob jugo.
Nunca fui a favor da paridade na Assembleia da Republica. Nunca.
Até hoje.
A minha justificação quando não era favorável era precisamente que deviamos conseguir os nossos lugares com mérito, e não por simples necessidade de preencimento de estatísticas; e que se acontecesse, acabaria por nos trazer uma dose de desprezo, e voltaria-se o feitiço contra o feiticeiro.
No entanto, hoje, penso rigorosamente o contrário. Esta sociedade precisa de um abanão... não, de um tsunami cultural!Por vezes, são necessárias medidas drásticas para ter algum resquício de mudança positiva nas mentalidades. Precisamos de desigualdade, mas desta vez, ao nosso favor.
Temos que ficar no poder, ou pelo menos partilhá-lo para mudar as coisas, porque afinal, os deputados que temos, até nem grande mérito tem, e o desprezo, à partida, já o levamos colado à pele. De qualquer forma, tivemos sempre mais mérito do que a maior parte dos nossos colegas machos ao longo da vida, nos passos que demos. Engraçado, ultimamente, tenho ouvido muito: "oh?! casaste?! wow! tens coragem! Olha que a vida ser-te-ia mais fácil se não tivesses casado". Costumo responder que o problema é mais para o meu marido.
Com isto tudo não quero parecer uma feminista radical (sim... daquelas que não querem usar soutien...e ainda bem que elas existem!), mas gostava que a maioria dos homens se parecessem com o meu marido ou o meu pai. Pois, eles acreditam como eu na individualidade de cada pessoa, não na diferenciação por causa do género.